quinta-feira, 29 de maio de 2008

Clarice Lispector "me lê"

Creio que só volto a postar na próxima semana assim sendo, deixo um texto de Clarice para que reflitam. Não na pose de arrogante, nem na ‘chaminé humana’ (argh!) que a figura dela representa, mas nas palavras. Afinal ela consegue passar no papel o que demoramos vidas pra passar para os outros.Beijos!



Eis:

"Não entendo. Isso é tão vasto que ultrapassa qualquer entender. Entender é sempre limitado. Mas não entender pode não ter fronteiras. Sinto que sou muito mais completa quando não entendo. Não entender, do modo como falo, é um dom. Não entender, mas não como um simples de espírito. O bom é ser inteligente e não entender. É uma benção estranha, como ter loucura sem ser doida. É um desinteresse manso, é uma doçura de burrice. Só que de vez em quando vem a inquietação: quero entender um pouco. Não demais: mas pelo menos entender que não entendo."

Clarice Lispector

Manda bem, não? ;)

terça-feira, 27 de maio de 2008

Escolhas...

O céu brilha mais cedo esta manhã.
Escolhi flores naturais.
Poderia ter pedido as vermelhas, as rubras, as da paixão.
Mas daí lembraram-me que ficariam sem foco, perto do que sinto por você.
Poderia ter escolhido coloridas.
Mas daí lembraram-me que elas ficariam sem foco, perto da felicidade que ilumina minha face hoje, com você.
Quis as brancas. Os copos-de-leite, compridos. Era paz, paz pra equilibrar a paixão. Paz pra equilibrar a emoção. Paz pra aquele dia, prelúdio de muitos. Paz pra o amém. Paz para o sim. Paz para nós.
Escolhi os cabelos presos. Apenas pra que o rosto ficasse à mostra de tudo isso. Pra todos verem tudo.
Escolhi o tomara-que-caia, para apertar meu peito segurando o pulsar do meu coração, sem compasso.
Escolhi o vivo para pintar o rosto, apenas em símbolo deste dia.
Escolhi o branco. Escolhi a paz. Escolhi ficar com você.
E eu direi sim, e nós seremos pra sempre.
E céu brilhará mais cedo, todas as manhãs.

segunda-feira, 26 de maio de 2008

Por cima?

Fale-me mais sobre isso. Eis aqui meu divã.
Escorra a sua alma por ruas desgastadas pelo peso da multidão que assiste suas quedas, como eu. Fale-me mais. Ou tão somente, escreva. Cante aos quatro ventos, aos quatro cavaleiros, aos quatro cantos; cante como você é. Depois cantarei eu, liricamente e bem alto, como sou. Creio que as notas graves suas, com as minhas agudas não combinam.
E eu poderia ajudar você, se eu quisesse. Poderia com poucas palavras dizer o que precisa fazer para parar de dar errado. Mas não quero. To cantando pra quebrar sua vidraça. Você canta para ganhar compaixão de algum coração. Vamos. É... você não cabe aqui. O divã não foi projetado para acomodar um corpo tão auto-suficiente quanto o seu. Então, o projete você. Mostre a eles. Mostre-me. Mostre-se. Vai lá, arregace as mangas, chuta o pau da barraca, faça bem bonito.
Não espere aplausos.
Ouça sua voz ecoar por corredores conhecidos, seu próprio abismo, nosso hospício.
Que a loucura seja bem dita, que alguém mais sinta seus devaneios, como eu sinto. E sintam pena, porque eu não consigo.
Ah sim, o divã, aceita-o? Aceita um café, pra começar? Fique à vontade. A sua dor eu já sei de cor, mostre algo novo: humildade e fique á vontade. A minha vontade.

sexta-feira, 23 de maio de 2008

...

‘Se tivessem combinado, não daria tão certo’, clichê.
Ela se foi, ele ficou, ela chegou.
Os cantos das bocas tremem.
Ela já se foi, não corre o risco de vê-los em flerte.
Mente. Ela está sentindo cada risada com lágrimas. Ela está sentindo cada coração pulsando rapidamente, como o seu apertado, sufocando.
Lá eles conversam sobre as novidades, o tempo que passou, o último telefonema.
Já longe ela relembra, sem saber por que a memória lhe trai. Estava doendo, mas o quê?
Não, não houve mais que palavras, não desta vez. Mas a reaproximação partiu-a; novamente um cristal quebrado. Novamente aços para juntar, estilhaçando por dentro, ferindo as mãos. Novamente nada será igual, ela nunca irá se recuperar. Ela não sabe mais o que é desculpar.
Ela não quer mais desculpar. Era cristal, virou aço cristalizado. Há fusão? Ela já não sabe responder, mudou as respostas, surgiram novos porquês.

sexta-feira, 16 de maio de 2008

Fique comigo.

Devo ter apagado por alguns instantes.
Por longos instantes.
O corpo parecia anestesiado por completo. Não sentia nada. Ouvia pouco e o que via era incerto.
Não entendia. As vozes diziam, mas eu não entendia.Vi rostos, que reconheci sem reconhecer, preocupados. Uma mão aflita segurava a minha, como que dando força, mas eu não sabia por quê. Não me lembrava de nada das últimas horas, o estado entorpecente me fizera esquecer das coisas ruins também, foi bom.
O quarto era branco, o silêncio era ensurdecedor. As pessoas, aflitas. Eu calma. Alucinadamente calma. Sedada, observando os movimentos como simples nuances, pessoas sem forma, cores indefinidas. Apaguei, o soro já estava no seu final, à mão aflita agora acariciava meus cabelos, eu ainda pensava estar num ‘sonho’. Era real. A sensação de buraco dentro do corpo, era real. Nada doía. Nada fazia chorar. E isso era apavorante. Não sei quem me levou. Não sei por que fui. Não sei como saí. A mão aflita que esteve comigo registrou cada maçaneta, cada papel, cada lágrima minha pela perda de uma semana de memória e me colocou a par de tudo, acariciando meu rosto, retirando-me do desespero.
Não pude esquecer do que me fez viver. Nunca poderei, nunca ousarei. Para você, eu prometo.
....apenas fique comigo, por todas as manhãs e noites, esteja comigo...

quinta-feira, 15 de maio de 2008

o Amor, o Primeiro.

...
Amanheceu mais um dia na cortina sem cor, mas cheia de vida.
Rodopiava o quarto e cantava. Tirou dos pulmões a mais bela voz do mais belo canto no mais belo dia.
Entregou-se. Que venha a paixão, pintando o quarto de rosa e vermelho, transformando o chão em plumas leves, abrigando sorrisos em pensamentos tolos, veio!
Vestira o traje do romantismo. Maquiou-se da forma mais angelical que pôde, e foi.
Andou por ruas barulhentas de asfalto cinza e via pássaros, campo e flores.
A fumaça dos carros era brisa floral; os arranha-céus castelos encantados.
Nunca soubera de coisa parecida antes; e era bom.
Ninguém poderia tocá-la, ninguém poderia feri-la, só ele.
Só ele era tão poderoso naquele momento.
Ninguém ousou desfazer, nada mudaria o que estava vivendo.
Sua carruagem chegara, seu sapatinho de cristal estava nas mãos apropriadas, vestira-se de princesa. Foi ao encontro dele.
Seus olhos envoltos por magia cederam lugar à imagem dele, a barba por fazer, a camisa do time de futebol, tênis e calça jeans apertando a barriga.
E a imagem era outra, todos os dias.
Ele era príncipe, mas não sabia.

terça-feira, 13 de maio de 2008

Fragmentando.

As articulações no pescoço estão funcionando bem.
O reflexo mais vivo que nunca, eu vi.
Subi os degraus tão rapidamente quanto seu olhar congelou-me e mudou de direção.
Você estava lá, eu também.
Ainda confrontei-lhe por alguns passos dados, passei por você que em estado de petrificação, não se voltou, não me olhou, não viu meu sorriso a chamar-te com saudade.
Quem sabe?
Talvez as linhas do tempo estejam mais apagadas agora.
E tanta coisa que nela escrevemos ficou ilegível, esquecemos o que éramos, despimo-nos.
Os trajes novos não combinam mais, quem sabe?
Talvez você, porque eu ... Não entendi e nada mais sei.
Só sei de saudades, saiba disso.

terça-feira, 6 de maio de 2008

Eu fico o dia inteiro mergulhada em nada.
Perdão, não é em qualquer nada, mas sim no MEU nada.
Não produzo nada, nada leio, não sei de nada, nada faço.
E era tão bom não ser nada. Não enxergar nada. Nada dizer.
Era, posto que nada aconteceu.
E acontecendo nada, nada tem novidade, graça ou brilho.
Estou eu perdida no meio do nada, eis que ainda sou nada.
Nada se produz, nada sai do lugar.
E o mundo está nadando no meio do nada, mergulhado, afundando.
E eu estou sentada no meio do nada, observando nada acontecer.
Nada muda, nada mudo, nada mudamos.
Assim, nada mudará.